para onde vão os minutos que dançam no espaço que ainda há entre minha boca e a sua quando optamos por deixar os encontros marcados para um outro dia. andam por onde todos os pontos de interrogação e as vírgulas e as pontuações desse amor nada ordinário. e por que que desde quando o ordinary da língua inglesa conheceu meu vocabulário eu procuro pelo desenrolar dessa tradução ainda que não faça o mínimo sentido. será que estão todos os minutos e as regras e as traições linguísticas juntas numa mesma caixa dentro de outra caixa e todas elas num beco qualquer do subconsciente de alguém com complexo de abandono. todas as vezes que entro num avião eu penso muito no marco do relógio e as linhas imaginárias que determinam em números se te digo bom dia ou boa noite. que são muito parecidas com as que eu criei no vôo da barra da tijuca para o brooklyn há cinco meses: ideias perpendiculares e calculadas para saber se -e quando- te diria bom dia ou boa noite. logicamente tudo isso só faz sentido se escrito por cima das nuvens; entre o aperto de dois seres estranhos; pairando mas feito germe invisível aos olhos de forças outras maiores; quando todos nós -até mesmo o moço com uma blusa florida que eu odiei- juntos formamos algo parecido com o que se vê no microscópio ao analisar grãos de areia. e tudo isso também só para dizer que escrevo de dentro de um avião que não tenho medo pois não é como se fosse um bicho e eu um mato. a proximidade urbana ainda que em temos como esses me dá menos arrepio do que o silêncio interrompido por grilos e sapos em minas gerais no sítio do meu avô. que talvez eu vá. será que esse vôo do brooklyn para miami e de miami para o rio me daria uma carona para a colina mais alta da cidadezinha do meu avô. teria com certeza espaço suficiente para pousar um avião naquele pomar; bem ali; perto das acerolas; o plano de fundo da imagem nítida do maior medo da minha vida. os cachorros. acerolas não. os cachorros que soltos corriam por todas as frutas e outras plantas que eu não saberia o nome até que decidiram por minhas pernas pequenas que tiveram validade de liberdade por apenas cinco anos. depois daquele dia não haveria mais um passo se quer sem o medo de encontrar um cachorro na próxima esquina. eu li aquele livro que se chama o peso do pássaro morto da aline bei e nele tem uma história com morte e cachorro. foi o primeiro livro que eu li que tinha alguém que talvez fosse ter medo de cachorro. mas até a personagem superou aquela página e eu não. aí fiquei com um pouco de raiva da minha expectativa de identificação não atingida. mas foi bom. o livro. não a raiva. agora imagine você se um avião pousasse no pomar do sítio do meu avô bem perto das acerolas que foram plano de fundo do único dia em que meu medo foi real. digo numa realidade paralela. levantaria muito vento e muita fumaça e provavelmente levaria muito pedaço de árvore lá para longe depois da plantação-que-eu-sei-lá-que-meu-avô-planta. se eu de vinte três anos de expirada estivesse descendo pelas escadas de um avião que viajou a geografia inteira só para proteger a minha eu de cinco anos de validade. caramba. para onde vão os minutos que a gente deixa de viver por conta dos medos que só foram reais um dia; mas que foram suficiente para tornarem-se; além da eternização do momento; um ponto de partida que sequer deixa mexer. são muitas as caixas dentro de caixas escondidas no beco do inconsciente histérico e medroso de uma mulher traumatizada mas que ainda acredita no amor do outro -até dos que usam camisa de flores- e não tem medo de avião mas sim de coisas menores. como cachorros. ou ainda menores. como abelhas.
caralho eu sei lá
você aluga vários triplex na minha cabeça (no bom sentido) toda vez que eu te leio mesmo que a maioria dos textos eu termine assim “emoji de boca aberta emoji espantado emoji explodindo a cabeça emoji com estrela no olho”
sabe…? muita coisa!
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