me despeço de casa todos os dias que me distraio com a paisagem como agora aqui nesse táxi atravessando a ponte quase-rio e é mais ou menos assim eu fecho os olhos como quem faz um pedido pra ver se consigo lembrar de cada pedaço mal construído do ex-nosso apartamento
sinto que envelheço quarenta e cinco anos a cada linha brega que escrevo sobre o fim prático ou a morte da praticidade (ainda não decidi) de nós porque o limite da poesia é quem fica com a mesa de jantar e o retroprojetor e a calça de tucanos
de novo minha vida-futuro é um quarto com um só armário desorganizado por cor ou talvez nem isso talvez só uma cômoda ou nem isso porque talvez eu compre uma cama de solteiro pra caber uma mesa que nunca vou sentar a não ser que caiba em frente a janela ou nem isso porque talvez não tenha janela e aí de repente brigo pela cama de casal e conquisto a fortaleza de travesseiros que só eu gostava mesmo
que ruim é rebobinar moradias eu pergunto do nada pro taxista que me pergunta hein e eu respondo ah deixa pra lá e penso que ainda não descobri como é que faz pra calar a mágoa ecoando na ponte enquanto tento me encontrar pelos muitos anúncios de aluga-se um canto na cidade-mais-solitária-do-mundo-porém-depende
lá vou eu mais uma vez pisar no JFK sem nem mesmo uma língua afiada que acompanhe um plano-capricorniano criado pra me despedir de casa pra dessa vez entender-visualmente com a história desses olhos que nunca ligou que na verdade já estava tudo destruído (casa ou não) antes mesmo de tudo e qualquer mudança etc
Um tiro teria doído menos. Amo tua escrita!
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Meus Deus que dor
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Nalu tua cabeça deve ser um turbilhão por segundo na moral
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