do leme pro flamengo
são dezessete minutos
mesmo num dia de trânsito e chuva
é quinta feira e do leme pro flamengo
leva dezessete minutos
poucas coisas na vida eu sei a hora
eu não conto números eu conto pausas
conto árvores até chegar ao prédio
me pergunto quantos porteiros tem
no rio de janeiro
da nova casa no brooklyn
até o antigo trabalho
são trinta e um minutos
mesmo num dia de usar cueca no metrô
é segunda feira e do brooklyn até manhattan
leva trinta e um minutos
muitas coisas na vida eu sei o endereço
mas não olho os números da rua
conto barraquinhas de cachorro quente
até chegar ao prédio
vou me perguntando
quantos doormen será que tem
em nova iorque
do leme pro brooklyn são dez horas
com escala em são paulo são talvez quatorze
com escala em miami são talvez doze
dentro do avião não existe o tempo do relógio
tudo ali parece perdido entre o passado
e presente e de futuro só pasta or chicken
nunca sei se estou in the airplane
ou on the airplane
sei que tomo conta da geografia
e observo o avião digital atravessar
o amazonas na tela e penso
nossa como é grande o brasil e
nossa são seis horas voando sob o brasil
e o brasil não acaba nunca
acaba mesmo não
brasil
descubro meu corpo muito mais vivo
depois de dez horas sentada numa poltrona
descubro que minha mandíbula deve ser torta
porque dependendo da posição do dedo
alinhado com o dente prestes a roer unha
eu acabo mordendo e prendendo a bochecha
e dói bem mais do que descobrir que o café
da manhã que o aeromoço serviu é cream cracker
com geleia quando se odeia geleia
odeio geleia
talvez se eu tivesse um paladar mais nômade
poderia explorar melhor o cardápio do japonês
que eu gosto lá na puta que pariu do queens
talvez se eu soubesse os minutos que leva
pra ir de casa até lá eu acharia menos puta que pariu
e mais num-pulo-a-gente-tá-lá
o queens é um buraco negro no espaço tempo
e é praticamente impossível dizer exatamente
quantos minutos leva pra chegar até
qualquer avenida grega de restaurantes brasileiros
quando se odeia geleia a vida é mais difícil
principalmente pra quem resolve morar
na terra do peanut butter n jelly for breakfast
and jelly in the panqueca que é doce only
mas com certeza mais difícil é a vida
do estadunidense que nunca comeu uma panqueca
de carne
do meu quarto até o banheiro eram alguns
barulhos do meu pé pisando forte na madeira
e Girannette reclamava que eu pisava alto
que os móveis e os vizinhos sabiam todos
os passos que eu dava dentro de casa
era um absurdo mas também a minha marca:
the desfile triunfal do xixi da madrugada
não gosto de piso branco porque gosto de andar
descalça e sem roupa e me parece que o chão de taco
antes de ser moda era também a maneira correta
de se construir um apartamento com sala de estar decente
não ando de chinelo e nem de pantufa que minha vó me deu
aliás me desculpa vó
eu só ando de meia no corredor do avião
mas só porque ali dentro todo mundo tem
permissão de ser tudo aquilo que nunca seria
em terra firme como por exemplo
fã de filme do adam slander que desfruta
de geleia que é a própria des-frutação
e uma saudosista das medidas de tempo perdidas
entre um bairro e outro do rio de janeiro
esse título é fruto de uma conversa com Maria Eduarda e Rebeca.
é massa sentir os seus textos, nalü 🖤
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eu gosto do movimento que tuas palavras causam
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Amo demais nalü
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Quanta tranquilidade encontrei aqui…
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você é foda, é bonito a beça te ler, quero morar em cada linha :’)
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Eu gosto bastante de ler as coisas que tu escreve. É sempre muito visual, são várias imaginações. Obrigada pela escrita Ü
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escreve*
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